RECURSO – direito civil. apelação cível. desconto em benefício previdenciário. juros de mora. honorários de sucumbência. parcial provimento.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação cível contra sentença que julgou procedentes os pedidos para declarar a inexistência de relação jurídica entre as partes e condenar a associação requerida à restituição em dobro da quantia descontada do benefício previdenciário da autora.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. Há três questões em discussão: (i) saber se é necessária a suspensão dos autos; (ii) saber se os juros de mora devem incidir a partir dos descontos indevidos; e (iii) saber se os honorários advocatícios devem ser majorados mediante fixação por apreciação equitativa.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. Inaplicável a suspensão determinada quando da homologação do acordo na ADPF 1236, tendo em vista que o escopo da lide é limitado à apuração de inexistência de relação jurídica com...
(TJSC; Processo nº 5007124-55.2024.8.24.0036; Recurso: recurso; Relator: Desembargador EDUARDO GALLO JR.; Órgão julgador: Turma, j. 21.6.16)."; Data do Julgamento: 13 de novembro de 2025)
Texto completo da decisão
Documento:6936143 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5007124-55.2024.8.24.0036/SC
RELATOR: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
RELATÓRIO
V. D. C. B. propôs "Ação Declaratória de Inexistência de Relação Jurídica e Indenização por Danos Materiais", perante o Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Jaraguá do Sul, contra ASSOCIACAO DE APOSENTADOS MUTUALISTA PARA BENEFICIOS COLETIVOS - AMBEC.
Na inicial, narrou que constatou a existência de descontos mensais em seu benefício previdenciário, sob a rubrica CONTRIB.AMBEC, com os quais não concordou, uma vez que desconhece a associação ré e nunca utilizou qualquer benefício ofertado. Sustentou que não mantém relação jurídica com a requerida, e que os valores indevidamente descontados devem ser restituídos em dobro. Defendeu a aplicabilidade do CDC e da inversão do ônus da prova. Ao final, requereu a gratuidade da justiça e a procedência dos pedidos, para declarar a inexistência da relação jurídica e determinar a repetição dobrada do indébito (evento 1, DOC1).
Deferida a gratuidade da justiça (evento 4, DOC1).
Citada, a parte ré ofereceu contestação, preliminarmente alegando que faz jus à gratuidade da justiça, tendo em vista que é associação sem fins lucrativos atuante em prol da pessoa idosa, além de impugnar o benefício concedido à parte. Discorreu a respeito de suas atividades, relacionadas à representação dos interesses dos seus associados, pessoas idosas, oferecendo diversos benefícios. Defendeu que a autora firmou o negócio jurídico em apreço, pois não é plausível a alegação de que teria percebido a indevida redução dos valores necessários à sua subsistência apenas após passados quatro meses dos descontos.
Argumentou que a relação jurídica entre as partes é válida, pois o cadastramento de novos associados exige a indicação de dados personalíssimos, de modo que os descontos no benefício previdenciário não configuram ato ilícito, mesmo porque a autora concordou com os termos, de acordo com a gravação de ligação telefônica. Alegou que eventual procedência dos pedidos da autora produziria consequências sociais maléficas, porquanto prejudicaria a continuidade da atividade da requerida em prol da comunidade de pessoas idosas. Postulou pela improcedência dos pedidos (evento 12, DOC1).
Réplica ofertada, em que a autora argumentou que a requerida apresentou apenas contrato com Intimadas acerca das partes que pretendiam produzir (evento 18, DOC1), as partes não se manifestaram.
Na sentença, o Dr. Ezequiel Schlemper julgou procedentes os pedidos iniciais, nos termos do dispositivo a seguir transcrito:
Ante o exposto, resolvo o mérito da demanda, julgando procedentes os pedidos deduzidos na petição inicial (art. 487, I, do CPC), para:
a) desconstituir os débitos e o negócio jurídico questionado em juízo (CONTRIB. AMBEC 0800 023 1701), declarando-o inexistente; e
b) condenar o réu ao ressarcimento do valor das parcelas descontadas diretamente no benefício previdenciário da autora em relação ao contrato mencionado no item anterior, de forma dobrada, a serem quantificados por mero cálculo aritmético, corrigidas pelo INPC desde os respectivos descontos, com a incidência de juros de mora de 1% ao mês a contar da citação, até 28-08-2024, quando passa a incidir a taxa Selic, deduzido o IPCA, nos termos estipulados pelo art. 406, caput e §1º do CC (Taxa Legal).
Condeno a parte passiva ao pagamento das despesas processuais pendentes, conforme arts. 86 e 87 do CPC. Fixo os honorários sucumbenciais devidos pela parte ré ao advogado do litigante vencedor no percentual de 20% sobre o valor condenação (item 'b' acima), conforme art. 85, § 2º, do CPC.
No ponto, indefiro o pedido de Justiça gratuita formulado pelo réu, por carência probatória da hipossuficiência; lembre-se que o réu demanda contribuição dos seus associados, de modo que imprescindível que tivesse trazido aos autos documentos comprovando a impossibilidade de pagamento das custas ("O fato de se tratar de associação sem fins lucrativos, por si só, não gera direito à isenção no recolhimento das custas do processo, e para obtenção do benefício é mister a demonstração de miserabilidade jurídica (REsp 1281360/SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, j. 21.6.16)." (TJSC, Apelação Cível n. 0023179-85.2008.8.24.0018, rel. Des. Francisco Oliveira Neto, j. 18-04-2017). Não se pode olvidar que a declaração de hipossuficiência retratada no § 3º do art. 99 do CPC enseja presunção relativa de veracidade da alegação de insuficiência, ao passo que os documentos juntados com a contestação não são suficientes para comprovação da impossibilidade de pagamento das custas (evento 26, DOC1).
Irresignada, a autora interpôs apelação cível. Alega, em suas razões, que: (i) os juros moratórios devem incidir sobre a restituição do indébito desde o primeiro desconto indevido; (ii) os honorários advocatícios devem ser arbitrados por meio do critério equitativo, de acordo com o piso remuneratório da tabela da OAB/SC. Ao final, postulou pelo provimento do recurso e reforma da sentença, para alteração do termo inicial dos juros de mora e majoração dos honorários de sucumbência (evento 30, DOC1).
Contrarrazões não apresentadas.
Comunicada a renúncia dos procuradores da requerida (evento 37, DOC1), o juízo determinou a regularização da representação processual (evento 39, DOC1).
A ré se manifestou, constituindo novo procurador (evento 56, DOC1).
Este é o relatório.
VOTO
O recurso merece ser conhecido, porquanto preenchidos os pressupostos de admissibilidade.
As alegações de litisconsórcio passivo necessário do INSS e incompatibilidade do procedimento, além do pedido subsidiário de ofício à autarquia previdenciária constituem inovação recursal, pois não arguidas pela requerida em sede de contestação (art. 341 do CPC) e não submetidas ao crivo do juízo de primeiro grau, de modo que não podem ser conhecidas por este Tribunal, sob pena de supressão de instância.
Além disso, arguidas em manifestação (evento 56, DOC1) que não pode ser conhecida como contrarrazões, uma vez que protocolada após decorrido o prazo legal (art. 1.010, §1º, CPC), contados a partir da intimação de evento 33. Ressalto que a referida intimação é válida, apesar de dirigida a procurador que não possuía mais poderes, tendo em vista que renúncia foi tempestivamente comunicada (evento 37, DOC2) e a parte deixou de constituir novo advogado, nos termos do art. 112 do CPC.
No tocante à superveniente homologação do acordo na ADPF 1236, o relator, Ministro Dias Toffoli, determinou a suspensão dos "processos e eficácia das decisões que tratam de controvérisas pertinentes aos requisitos, fundamentos e extensão da responsabilidade da União e do INSS pelos descontos associativos indevidos realizados por atos fraudulentos de terceiros".
Inaplicável a referida ao caso em comento, portanto, tendo em vista que o escopo da lide é limitado à apuração de inexistência de relação jurídica com a associação requerida, bem como os seus reflexos patrimoniais, e não se discute a responsabilidade da União ou da autarquia previdenciária.
Aliás, considerando que não houve insurgência da requerida contra a sentença, operou-se o trânsito em julgado sobre a declaração de inexistência da relação jurídica entre as partes, justamente porque a associação deixou de comprovar a autenticidade da autorização de descontos (evento 12, DOC3). Também se tornou imutável o capítulo da sentença relativo à condenação à restituição dobrada dos valores indevidamente descontados do benefício previdenciário da autora, no valor de R$ 45,00 mensais (evento 1, DOC10).
A respeito dos consectários legais incidentes sobre a condenação, inicialmente registro que se trata de matéria de ordem pública; passível, portanto, de modificação de ofício. Ademais, insurge-se a autora contra o marco inicial da incidência de juros de mora sobre a condenação, tendo em vista que a sentença os fixou a partir da citação.
Com efeito, a responsabilidade na espécie é extracontratual, tendo em vista que declarada a inexistência de relação contratual entre as partes, o que atrai a incidência do enunciado da Súmula n. 54 do Superior TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5007124-55.2024.8.24.0036/SC
RELATOR: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
EMENTA
ementa: direito civil. apelação cível. desconto em benefício previdenciário. juros de mora. honorários de sucumbência. parcial provimento.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação cível contra sentença que julgou procedentes os pedidos para declarar a inexistência de relação jurídica entre as partes e condenar a associação requerida à restituição em dobro da quantia descontada do benefício previdenciário da autora.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. Há três questões em discussão: (i) saber se é necessária a suspensão dos autos; (ii) saber se os juros de mora devem incidir a partir dos descontos indevidos; e (iii) saber se os honorários advocatícios devem ser majorados mediante fixação por apreciação equitativa.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. Inaplicável a suspensão determinada quando da homologação do acordo na ADPF 1236, tendo em vista que o escopo da lide é limitado à apuração de inexistência de relação jurídica com a associação requerida, bem como os seus reflexos patrimoniais, e não se discute a responsabilidade da União ou da autarquia previdenciária.
4. Como declarada a inexistência de relação jurídica entre as partes, a responsabilidade civil da associação é extracontratual, de modo que os juros de mora incidentes sobre a condenação devem fluir a partir do evento danoso, correspondente a cada desconto indevido.
5. Os honorários de sucumbência comportam majoração, mediante arbitramento com base no valor da causa, que é expressivo.
IV. DISPOSITIVO E TESE
6. Recurso parcialmente provido para alterar o termo inicial dos juros de mora, majorar os honorários de sucumbência e, de ofício, ajustar os índices dos consectários legais incidentes sobre a condenação.
________
Dispositivos relevantes citados: CPC art. 341, 1.010, §1º; CC art. 389, 406.
Jurisprudência relevante citada: Súmula 54/STJ
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Câmara de Direito Civil do decidiu, por unanimidade, conhecer e dar parcial provimento ao recurso de apelação, para alterar o termo inicial dos juros de mora, majorar os honorários de sucumbência e, de ofício, ajustar os índices dos consectários legais incidentes sobre a condenação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 13 de novembro de 2025.
assinado por EDUARDO MATTOS GALLO JUNIOR, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6936144v4 e do código CRC 10e996ee.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): EDUARDO MATTOS GALLO JUNIOR
Data e Hora: 13/11/2025, às 18:06:14
5007124-55.2024.8.24.0036 6936144 .V4
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 15:17:45.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas
Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL - RESOLUÇÃO CNJ 591/24 DE 11/11/2025 A 18/11/2025
Apelação Nº 5007124-55.2024.8.24.0036/SC
RELATOR: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
PRESIDENTE: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
PROCURADOR(A): ANTENOR CHINATO RIBEIRO
Certifico que este processo foi incluído como item 33 na Pauta da Sessão Virtual - Resolução CNJ 591/24, disponibilizada no DJEN de 27/10/2025, e julgado na sessão iniciada em 11/11/2025 às 00:00 e encerrada em 13/11/2025 às 12:32.
Certifico que a 6ª Câmara de Direito Civil, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª CÂMARA DE DIREITO CIVIL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER E DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO, PARA ALTERAR O TERMO INICIAL DOS JUROS DE MORA, MAJORAR OS HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA E, DE OFÍCIO, AJUSTAR OS ÍNDICES DOS CONSECTÁRIOS LEGAIS INCIDENTES SOBRE A CONDENAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
Votante: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
Votante: Desembargador MARCOS FEY PROBST
Votante: Desembargador JOAO DE NADAL
JULIANA DE ALANO SCHEFFER
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 15:17:45.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas